domingo, 21 de junho de 2009

Acordo com Santa Sé é polêmica no Congresso

O Globo, domingo, 14 de junho de 2009
Evandro Éboli

BRASÍLIA — Evangélicos e católicos estão em embate, dentro e fora do Congresso. No centro da discussão está o acordo assinado entre o governo brasileiro e a Santa Sé, em novembro de 2008. O documento, de 18 artigos, é tido por seus opositores como uma concessão de privilégios à Igreja Católica e uma ameaça à condição de Estado laico do Brasil. Para os defensores do texto, trata-se de um acordo entre dois Estados e a afirmação de princípios seculares. O texto precisa ser ratificado por Câmara e Senado.
O acordo prevê a criação do Estatuto Jurídico da Igreja Católica e tramita na Comissão de Relações Exteriores da Câmara, onde estão sendo travadas disputas ásperas. Os deputados evangélicos querem uma discussão ampla com líderes de outras religiões. Hidekazu Takayama (PSC-PR) quer debater com representantes das igrejas evangélicas, budistas, da Maçonaria, Protestante e da Seicho-no-ie. O clima esquentou na comissão.
— É um acordo entre dois Estados, não um debate religioso. Isso é uma perseguição pior que a Inquisição — atacou o católico Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR).
Takayama reagiu: — Inquisitor é V. Excelência.
Texto do acordo trata de partrimônio a tributação
O acordo prevê a preservação do patrimônio histórico, artístico e cultural da Igreja Católica; estabelece que nenhum edifício, dependência ou objeto de culto católico pode ser demolido; trata do ensino religioso, do casamento, da destinação de espaço para celebrações da Igreja e da imunidade tributária. Para evangélicos, pesquisadores e algumas entidades não governamentais, como o CFemea — ONG feminista tradicional opositora dos católicos —, o estatuto amplia privilégios da Igreja Católica.
A professora Roseli Fischmann, do curso de pós-graduação de Educação da USP, estudiosa do tema, diz que o acordo eleva a Igreja Católica a um patamar oficialmente diferenciado das demais religiões no país:
— Como se trata da única religião com identidade jurídica, que é o Vaticano, a Igreja Católica tem o privilégio sim de assinar um acordo internacional, desses que nenhuma outra tem. E nem deveria ter. No Brasil, Estado e religião não podem se misturar como ocorre com esse estatuto. Não importa se a maioria da população brasileira é católica. Isso não vem ao caso. Não significa hegemonia.
O secretário-geral da CNBB, dom Dimas Lara Barbosa, diz que há um mal-entendido em relação ao Estatuto da Igreja Católica. Para o religioso, o acordo não fere a laicidade do Brasil por se tratar de um tratado entre dois Estados.
— Se fosse um projeto de lei, aí, sim, estaríamos diante de uma ingerência, de uma mistura não muito saudável entre Igreja e Estado. Mas é um acordo que, ao contrário do que dizem aqueles que se opõem a ele, reforça a condição de Estado laico do Brasil — disse dom Dimas.
Para o bispo, o acordo entre Brasil e Vaticano não concede privilégios à Igreja Católica, mas reconhece a personalidade jurídica da Igreja e confirma preceitos de dois mil anos.
O contra-ataque evangélico virá com a proposta da Lei Geral das Religiões, que será apresentada por George Hilton (PP-MG), ligado à Igreja Universal do Reino de Deus. É uma adaptação do Estatuto da Igreja Católica. Só que os benefícios são estendidos a todas as religiões.

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